Transposição da Diretiva (UE) 2020/1828 relativa a ações coletivas para proteção dos interesses dos consumidores

Versão de impressãoVersão PDF

Foi publicado, no dia 5 de dezembro, em Diário da República, o Decreto-Lei n.º 114-A/2023 que procede à transposição da Diretiva (UE) 2020/1828, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 25 de novembro, relativa a ações coletivas para proteção dos interesses coletivos dos consumidores e que revoga a Diretiva 2009/22/CE.

A Diretiva (UE) 2020/1828 representou um passo muito importante na proteção dos consumidores europeus, na medida em que, através dos mecanismos previstos de ação inibitória e de reparação, permite aos consumidores efetivar os seus direitos a nível europeu. Ao contrário de Portugal que, desde 1995, dispõe de mecanismos de reparação através das ações populares em caso de violação dos direitos dos consumidores, em alguns Estados Membros tais mecanismos não se encontravam contemplados, pelo que esta nova diretiva veio preencher essa lacuna assegurando que em todos os países da União Europeia vigora um sistema de ações coletivas para a proteção dos interesses coletivos dos consumidores contra violações do Direito da União.

É, assim, neste enquadramento que o novo Decreto-Lei n.º 114-A/2023 vem estabelecer um mecanismo de ação coletiva que vigorará no ordenamento jurídico nacional em paralelo com o regime consagrado na Lei n.º 83/95, de 31 de agosto (Lei de Ação Popular). Com efeito, sempre que estejam em causa infrações às disposições do direito nacional e da UE identificadas no anexo I da Diretiva que lesem ou sejam suscetíveis de lesar os interesses coletivos dos consumidores será aplicável este novo regime.

O novo diploma de transposição mantém, todavia, diversas regras já previstas na Lei de Ação Popular, designadamente as relativas aos titulares do direito de ação coletiva que continuam a ser as associações, as fundações e as autarquias locais. Não obstante, de forma a garantir um alinhamento com os critérios de designação das entidades qualificadas previstos na diretiva, o legislador nacional entendeu alargar o elenco relativo aos requisitos de legitimidade, passando a incluir requisitos relacionados com a independência das associações e fundações e com o financiamento de ações coletivas por terceiros.

Mantém-se, igualmente, o mecanismo de representação processual que se encontra estabelecido na Lei de Ação Popular, isto é, o “opt-out”, excecionando-se apenas os consumidores que não tenham a sua residência habitual em Portugal, que terão de manifestar a sua vontade em ser representados na ação (pelo que, a estes, se aplicará um mecanismo de “opt-in”).

De entre as novidades que o Decreto-Lei n.º 114-A/2023 nos traz, encontra-se a consagração de um mecanismo processual de ação coletiva ao nível da UE, prevendo-se a possibilidade de entidades qualificadas designadas por outros Estados-Membros interporem ações coletivas transfronteiriças junto dos tribunais nacionais. Adicionalmente, e com vista a permitir que entidades nacionais possam interpor ações coletivas transfronteiriças noutros Estados-Membros, o diploma vem estabelecer um procedimento de designação destas entidades como entidades qualificadas, prevendo-se, para esse efeito, um elenco de critérios harmonizados que aquelas terão de observar.

Cumpre, ainda, destacar as novas regras relativas ao financiamento de ações coletivas por parte de terceiros, com efeito o diploma vem estabelecer um conjunto de obrigações aplicáveis aos demandantes que recorram a financiamento, designadamente, a disponibilização ao tribunal do acordo de financiamento, incluindo uma síntese financeira com a enumeração das fontes de financiamento utilizadas para apoiar a ação coletiva, devendo este acordo garantir a independência do demandante e a ausência de conflitos de interesse.

Por fim, cabe notar que o novo decreto-lei estabelece regras que visam garantir que os consumidores são devidamente informados sobre as ações coletivas intentadas em Portugal. Com efeito, além das obrigações de divulgação aplicáveis aos demandantes, que terão de disponibilizar nas suas páginas da internet um conjunto de informações relativas às ações intentadas por si, prevê-se ainda a disponibilização de informação por parte da Direção-Geral do Consumidor, que será a autoridade competente responsável pela designação das entidades qualificadas, bem como, o ponto de contacto nacional para efeitos do cumprimento das obrigações de comunicação à Comissão Europeia estabelecidas no Decreto-Lei n.º 114-A/2023.

Poderá consultar o novo diploma aqui.